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DESVALORIZAÇÃO PROFISSIONAL DA EDUCAÇÃO FÍSICA

Foto do escritor: Cleber DiasCleber Dias

Cleber Dias


O assunto é recorrente em salas de aula de cursos de graduação em educação física. Porque afinal o educador físico é um profissional tão desvalorizado?


Todavia, a constatação acerca desta imaginada desvalorização, muito repetida por estudantes e profissionais, expressa mais a frustração de uma expectativa do que uma realidade indiscutível. Os que diagnosticam essa desvalorização naturalmente esperam e desejam que as coisas fossem diferentes. No entanto, ao invés de nos perguntamos porque educadores físicos são tão desvalorizados, poderíamos também nos perguntar porque educadores físicos deveriam ser mais valorizados do que são?


O Brasil é um país pobre, onde o trabalho é geralmente mal remunerado, como acontece em todos os países pobres. É precisamente isto o que define a pobreza de um povo. Se o trabalho aqui fosse bem remunerado, o Brasil seria um país rico e eu possivelmente estaria escrevendo sobre outro assunto.


O total de riqueza do Brasil distribuída igualmente por cada um dos seus habitantes equivaleria a cerca de R$ 2.500 por mês. Apenas para dimensionar a grandeza ou pequeneza desse montante, nos Estados Unidos, esse valor é de cerca de R$ 17.500. Assim, para aumentar os rendimentos, mudar de país, antes de mudar de profissão, talvez seja uma alternativa.


A educação física não é uma área especialmente privilegiada na degradação geral do trabalho. Em média, estima-se que os salários de um educador físico variem entre R$ 1.000 e R$ 4.000 por mês, enquanto a renda média no país é de cerca de R$ 1.800 por mês. Um educador físico, em suma, mesmo supondo que ganhe menos do que gostaria, tende a ter rendimentos acima da maioria dos trabalhadores.


Seria possível ganhar ainda mais? Talvez.


Uma das razões que determinam remunerações é o valor agregado pelos trabalhos. A educação física é uma área de atuação com pouca inovação e baixa sofisticação tecnológica. Logo, os rendimentos oferecidos ali tendem a ser menores do que em outras áreas mais permeadas por essas qualidades. Fazer cirurgias, construir pontes ou criar novos negócios é mais complexo e tem maior capacidade de geração de riqueza do que contar abdominais, motivo pelo qual remunera-se melhor os que fazem cirurgias, constroem pontes e criam novos negócios do que os que contam abdominais.


Ao contrário do que acreditam muitos estudantes ou profissionais, os conhecimentos necessários para o exercício profissional da educação física são bastante simples. Não por acaso, o curso de formação em educação física pode ser classificado como fácil, especialmente se comparado com cursos mais exigentes. A linguagem empolada e eventuais termos técnicos servem apenas para disfarçar certa miséria intelectual. Usar o verbo “flexionar” ao invés de “dobrar” não faz dessa profissão tecnicamente complexa – o mesmo podendo ser dito para “decúbito ventral” e outras coisas do tipo.


Além disso, o educador físico oferece um serviço supérfluo e de luxo, que apenas os mais privilegiados podem consumir. Como resultado, o público desses serviços é pequeno, o que associado a oferta de mão de obra relativamente abundante, com mais de 1.000 cursos disponíveis em todo o país, agrava o quadro geral.


Aumentar o grau de inovação dos modelos de negócio dessa área de atuação, com mais criatividade e melhores conhecimentos, talvez seja um caminho para uma elevação geral dos rendimentos no setor. Mais inovação, criatividade e conhecimentos para novos modelos de negócios, bem entendido, não diz respeito ao aprofundamento em fisiologia, biomecânica e teorias do treinamento.


Algumas das oportunidades com melhores rendimentos no setor de esportes e atividades físicas estão disponíveis para cargos de gerência administrativa, onde o trabalho é realizado dentro de escritórios com ar condicionado, que pouco ou nada tem a ver com as particularidades técnicas do cotidiano dos que trabalham nos salões de musculação ou nas beiras das piscinas.


Sociologia para entender as dinâmicas do mercado de trabalho, antropologia para saber do comportamento do consumidor e economia política para vislumbrar inovações nos modos de estruturar novos produtos e serviços são alguns dos conhecimentos necessários para se poder aproveitar as melhores oportunidades nessa área. Tudo isso, porém, é precisamente o que a maioria dos estudantes de educação física reprova nos currículos dos cursos de formação. A ênfase nas dimensões técnicas e o desprezo pelo saber das ciências humanas nos cursos de formação em educação física condena esses estudantes e futuros profissionais aos piores postos de trabalho.

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