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INTERVENÇÃO NAS UNIVERSIDADES FEDERAIS

Foto do escritor: Cleber DiasCleber Dias

Cleber Dias


Em mais de uma dezena de vezes desde que foi eleito, Bolsonaro nomeou como reitor de universidades federais pessoas que não foram as mais votadas nas eleições realizadas entre estudantes, técnicos e professores. Tais indicações têm sido apontadas pelos críticos como "intervenções". Seriam adequadas essas críticas?


Para entender, é preciso antes saber dos mecanismos que orientam esse processo. Segundo a lei que regula o assunto (9.192/95), depois de eleições em que a comunidade acadêmica vota em professores que se apresentam voluntariamente para o cargo, os conselhos de administração das universidades, compostos por dezenas de representantes dos professores, técnicos e estudantes, enviam à Presidência da República uma lista com três nomes, elaborada a partir dessa consulta interna, dentre os quais, o Presidente deve então indicar qual é o da sua preferência.


Os críticos, no entanto, desejam que a escolha do Presidente esteja sempre subordinada ao desejo expresso pela maioria da comunidade acadêmica, conforme os votos distribuídos durante as eleições internas das universidades. Na prática, isso significaria tirar da Presidência da República a prerrogativa de nomear os reitores. Ao contrário do que dizem esses críticos, isto sim seria um golpe para a democracia.


As universidades, como órgãos do poder público, precisam estar subordinadas ao controle da sociedade. Uma das formas de se exercer esse controle é precisamente através do poder de nomeação atribuído ao representante político eleito pela maioria – não da universidade, mas da sociedade como um todo. Nesse sentido, o atual procedimento combina, de maneira até bastante engenhosa, a autonomia das universidades em escolherem seus dirigentes, com certo grau de controle do poder político. Por um lado, é a comunidade acadêmica quem define as três opções que o Presidente terá. Por outro lado, é o Presidente da República, em última instância e dentro das opções apresentadas pelas universidades, quem deve indicar quem afinal será o dirigente.


Eliminar a prerrogativa presidencial na nomeação de reitores, seria como eliminar, ao menos em tese, influências da política na administração das universidades, mais ou menos como alguns desejam quando falam em autonomia para o Banco Central. Em ambos os casos, a atividade política aparece denegrida como algo criminoso e corrupto, e que deveria, por isso mesmo, ser excluída dos mecanismos de gestão da coisa pública. Trata-se de uma mentalidade gerencial, que rejeita a política, ao mesmo tempo em que celebra ideais supostamente neutros e objetivos de administração. Um exemplo arquetípico dessa mentalidade fora o patético bordão de João Doria durante a campanha eleitoral que o elegeu prefeito de São Paulo, em que ele dizia, com orgulho e sem medo do absurdo, que não era político, mas sim um gestor - como se fosse possível ou desejável que a gestão pública prescindisse da política.


Todas as instituições públicas, porém, sejam as universidades, seja o Banco Central, devem estar sujeitas ao controle do poder político, o que equivale, em regimes democráticos, a subordinação dessas instituições aos representantes eleitos pelo povo, de quem emana todo o poder. De que adiantaria o povo eleger certo político para a Presidência da República, se este Presidente, depois de eleito, se visse impossibilitado de exercer influência sobre o funcionamento de instituições como as universidades ou o Banco Central?


É o Presidente da República, isto é, o chefe do Poder Executivo devidamente eleito, quem tem a legitimidade para indicar os dirigentes não apenas das universidades, mas de vários outros órgãos públicos. Se o Presidente da hora por acaso for alguém notavelmente incapaz, paciência; eleja-se outro melhor nas próximas eleições. Abdicar dos controles democráticos das instituições públicas sob o pretexto de tirar poder do atual ocupante do cargo seria um remédio que logo se tornaria veneno. Falsas e aparentes soluções de curto prazo não podem nos cegar para as consequências de longo prazo de certas decisões. A solução para os nossos impasses é mais política, não menos.

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