Cleber Dias
Em março deste ano, passei por processo de avaliação a fim de pleitear promoção dentro dos quadros da carreira docente universitária. O relatório que apresentei na ocasião vem à luz agora em forma de livro, pela Editora Comenius e com prefácio de Wecisley Ribeiro e uma apresentação de Rafael Fortes.
A partir da experiência de trabalho nos últimos oito anos na Universidade Federal de Minas Gerais, o livro busca uma breve reflexão sobre os dilemas e desafios do modo de organização das nossas universidades. Mais especificamente, conforme indica o subtítulo do livro, a burocratização e a politização dos ambientes acadêmicos oferecem o fio condutor para esta análise.
O caráter sui generis do trabalho universitário exige o reconhecimento das peculiaridades para os modos de atuação política neste ambiente, em especial. A rigor, universidades não fazem política, embora seus cientistas sim o façam. É antiga e conhecida a famosa distinção formulada por Max Weber entre a ciência e a política como duas diferentes vocações. A ciência é o espaço social da dúvida metódica, ao passo que a política é o espaço social da ação que visa a transformação da sociedade em dada direção. Em grande medida, os requisitos e premissas dessas duas vocações são de fato diferentes, ou conforme dissera já Raymond Aron, em outros termos, mas nesse mesmo sentido, “a ação na história exige que se decida sem saber ou, pelo menos, que se afirme, na decisão, mais do que se sabe”. É tudo o que a atuação científica de certo modo não admite.
"Trata-se de obra estimulante para os que veem problemas e entraves – a maioria existentes há décadas – nas universidades e na produção científica realmente existentes no Brasil"
Rafael Fortes
Naturalmente, as atividades científicas têm consequências políticas. Disso não decorre, contudo, que tais atividades se confundam com a própria política. Parte do descrédito de que padecem atualmente as universidades e até o discurso científico, de maneira mais geral, é resultado de uma reação social ao inadequado partidarismo e politização da própria universidade. Assim, ao se subordinarem aos dogmas ideológicos da política, ambientes acadêmicos corroem a credibilidade pública da ciência, que deveria ser equidistante, para não dizer isenta, ao mesmo tempo em que empobrece a política, uma vez que lhe priva da contribuição única que apenas a reflexão metódica e rigorosa típica da ciência pode oferecer. Ao relativizar o ideal de busca da verdade em favor de um engajamento político com certas causas estabelecidas “para além do que se sabe” – para usar a fórmula de Raymond Aron – os pilares do edifício epistemológico que sustentam o fazer científico quedam então deteriorados. Quando orientado pelo critério da conveniência política ou da adequação ideológica, o trabalho acadêmico deita por terra os critérios das boas práticas científicas. Nesse caso, em outras palavras, o critério de validação ou aceitação de certas conclusões passa a ser meramente político ou ideológico, ao invés de propriamente acadêmico.
"a função política da ciência se realiza quando, antes de tudo, ela cumpre sua função científica [...] O livro de Cleber constitui, nesse sentido, uma ilustração singularmente
lúcida da vocação científica"
Wecisley Ribeiro
Com efeito, depois da burocratização, a politização extremada e fora de medida é outro aspecto relevante a concorrer negativamente para a esterilização pedagógica e intelectual dos ambientes universitários. Tal como opioides, o fetiche pela burocracia e a politização extremada atuam para uma espécie de entorpecimento da vida universitária.
O arquivo completo com o livro pode ser obtido no link abaixo.
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Vou ler a obra do amigo Cleber, mas já faço a crítica ao título. A universidade tem que ser política (pegando o sentido amplo de cuidar do bem-comum, da polis). Sua partidarização, fragmentação, tendenciosidade, sem compromisso com os problemas reais do país é o que devemos combater. A universidade brasileira´, como já diagnosticou Darcy Ribeiro, não é a universidade necessária.